(post l-o-n-g-o)
Desde que cheguei do Brasil, as coisas viraram do aveso…completamente. Eu ainda estava sentindo aquela brisa gostosa da viagem, do aconchego junto à família, quando na mesma semana, a tempestade deu as caras. Tempestade só não…furacão.
No fim da mesma semana da volta, quando ainda me acostumava com decisão de voltar a trabalhar, de uma hora pra outra, sem aviso, a quantidade de trabalho do Brandon diminuiu significamente. Em trocadilhos, caiu 50%…e tratando-se de um emprego onde a pessoa ganha por hora…isso é um big, BIG deal. A surpresa veio porque há um jogo de interesses no meio.
Sendo assim…a idéia de voltar a trabalhar virou assunto urgente. Comecei a enviar curriculums, fui a inúmera entrevistas, e é com muita alegria que posições me foram oferecidas em 4 de 5 empresas que fui convidada à conversar.
A maior surpresa foi de uma agência, de New Jersey, que me ligou intermediando uma posição em uma grande companhia daqui. No começo, tudo bem normal…e uma entrevista via telefone foi marcada para o dia seguinte. Eu ODEIO entrevistas sérias pelo telefone, porque no fundo no fundo, não confio no meu inglês. Dito e feito…eu achei que me compliquei toda, e acreditei viamente que a conversa tinha sido um fiasco. Mas, não me abalei muito pois na mesma semana outras 2 entrevistas estavam marcadas, inclusive uma no Citi Bank que…só pra ser qualificada para a entrevista, tive que passar em um teste de 3 horas de duração.
Para a minha surpresa, no dia seguinte, a agência de NJ me ligou perguntando como pensei que havia me dado na entrevista…e sem rodeios, disse que mais ou menos. Pois acredite... rapaz disse que gostaram de mim, e que queriam me oferecer um contrato de 6 meses para a posição. Parecia até ser um scam, porque eu nunca fui contratada pelo telefone, sem uma entrevista pessoal. Mas mesmo assim me mandaram um contrato por email…e as dúvidas começaram a diminuir.
A entrevista no Citi Bank que durou quase 1 hora, pareceu ter sido boa também. E é por isso que acredito que me dou muito melhor pessoalmente. 2 dias depois me ligaram oferendo a posição…que não tem um salário bom (muito pelo contrário), mas ótimos benefícios (seguro saúde para mim e para a família, auxílio estudo - Universidade, plano de aposentaria, academia, assistência com child care, etc.). Como dizem alguns aqui…salário não é bem o que importa, e sim os benefícios, rs. A má notícia era que o próximo treinamento e consequentemente posição, só começam em Julho. Na nossa situação….não havia como esperar.
Resolvi aceitar a outra posição…que no começo achei muito boa pra ser verdade…na HP - Hewlett Packard. Acredite se quiser, aqui em Idaho encontra-se um dos grandes centros de serviços da companhia. Aliás, quem tem grana por aqui, geralmente trabalha lá, pois é a única companhia, além da Micron, que paga bem por aqui.
Há não ser esta boa notícia - que pra mim ainda não sabia se seria boa de verdade ou não - as coisas estavam desmoronando em casa. O serviço de Brandon, de ruim foi à pior, e as coisas pareciam não se encaixar de forma alguma, nem por decreto. Pra piorar tudo, no Sábado antes de começar meu treinamento, apenas dois dias antes antes do meu primeiro dia, a Becca deixa cair coca-cola no câmbio do carro. Carro automático, transmissão eletrônica…breakdown.
Juntou-se à ansiedade comum de começar um novo emprego…não ter carro. Tudo bem se você mora numa cidade com sistema de transporte, ou quando sobra uma graninha pra consertar o veículo….ou, ou ou….quando se há família por perto para dar uma carona, ou amigos próximos. Não era o caso. Não pense em andar à pé…nada é perto o suficiente. Lá vou eu pedir carona, pra amiga brasileira que mora à meia hora de mim. Primeiro dia da Becca na escolinha…alegria por ela, pelas novas “ amizadezinhas”, tristeza minha por não compatilhar mais todos os momentos com ela. Coisa de mãe…penso.
É lógico que quando vc está contando os centavos, aparecem grandes quantias à serem pagos. Pra variar, os milhares de dólares que pagamos para garantia quando compramos o carro, não valem de nada. Eles cobrem tudo tudo tudo…menos a pecinha mínima que quebrou, e que precisa ser trocada…junto com o resto do câmbio. Como a Mercedes tem um nome pra tal da pecinha, e eles tem outro…eles não cobrem. Mesmo que se trate exatamente da mesma coisa. Com mil e uma coisas pra pagar, trabalho pela metade...mais essa. E lá pra quarta-feira…lá estou eu chorando pela quinquagésima vez.
Mas…mesmo pedindo mil favores - que eu odeio - continuo chegando no trabalho, todos os dias. Dia é um que ajuda, dia é outro. Nesse meio tempo me encontro numa sala de 24 escolhidos na HP. Descubro que quase 500 aplicaram para as posições e destes menos de 100 foram escolhidos. Me sinto feliz. Dessa classe de 24, quase todos são formados…BS, BA, MBA etc e tal…a maioria tem, menos eu. E nisso me confronto com a realidade dos EUA que de fato…está num buraco. Recessão total.
Na sexta-feira…nada de carro consertado ainda. O que eu mais queria era chegar em casa, relaxar, tomar o meu vinho, e esquecer todos os problemas da semana. O Brandon e um amigo dele vão me buscar no meu trabalho no carro desse amigo. Quando você pensa que nada mais pode dar errado…pense melhor. O carro quebra no meio do caminho, no meio do nada. Back road. Eu, sem pensar duas vezes, começo a pedir carona…pois tenho que pegar a Becca na escola. Pois bem…sexta-feira…ninguém quer saber de parar pra ajudar…o negócio é chegar em casa! Cansei de pedir carona…embora muitos tenham parado, só perguntavam se eu precisava de um celular pra ligar pra alguém. Acontece que…eu não tinha pra quem ligar!!!
Quer dizer…minha amiga Germana, que me deu carona no primeiro dia do trabalho. Amigona! Liguei para ela que lá foi dirigir meia hora pra buscar a Becca. Um alívio…um problema à menos. Nisso, dois carros param…um deles uma Van de um mexicano pintor. No outro carro o patrão, me dizendo que o rapaz ía para a minha cidade, mas tinha que fazer um orçamento primeiro.
Antes disso tentam nos ajudar, Mexem, mexem, mexem no carro…e nada. Com o carro quebrado desde as 5 da tarde…eu já estava triste e nervosíssima às 7pm. Querendo chorar, só pra variar. Quando nada que fazem ajuda o carro funcionar, eles decidem ir embora. Lá vou eu, me acomodar no chão dessa Van cheia de máquinas e latas de tinta. Completa sujeira. O rapaz para numa residência, e lá continuo eu sentada no chão da Van por 45 minutos. Ainda bem pois, depois de tudo isso, ele me levou na porta de casa…mesmo morando há quase meia hora daqui.
Finalmente cheguei depois das 8 da noite, e ainda tive que ir buscar o Brandon e o amigo, que em todo esse tempo estavam esperando no carro. Quando chego, descubro que a polícia havia acabado de sair de lá…que os rodearam bem por 45 minutos, checaram as carteira e tudo mais…e só então entenderam de fato a situação. Ufa…era só o que me faltava!
Percebi o quanto dependemos de carro por aqui. Você - carro = NADA. Sinceramente, quase não se sobrevive sem carro aqui. Impressionante!
Depois do fim de semana….estava até com medo de colocar o pé pra for a na segunda-feira, mas…o que passou passou e tenho que ir trabalhar. Eu que as vezes quero desistir fácilmente, decidi ir em frente, mesmo que tudo estivesse desabando ao meu lado. Não estou sendo dramática…mesmo que pareça, não estou entrando em outros detalhes.
A coordenadora do treinamento decidiu dar um exame baseado na semana anterior de aprendizado logo na nossa chegada em classe. A minha auto-estima, no geral, é bem humilde nesta classe. Afinal, sou a única estrangeira. Todos, sem excessão, são americanos nativos…born and raised in America. Cheios de diplomas, grande experiência professionaL, impecáveis por assim dizer. Admito que no começo me senti o patinho feio. Não tive nenhuma simpatia…ninguém monstrou apreço pela minha diferença cultural. E nem eu quis ser diferente, só competente. E assim fiquei.
O exame acabou. Alguns se auto elogiando, confirmando a boa performance. Eu admito que fui bem, mas tinha certeza que pelo menos 2 respostas estavam possivelmente erradas. A coordenadora volta e diz que alguns não passaram no teste e terão uma segunda e última chance no dia seguinte (se não passarem, são demmitidos). Me senti confiante pois não pensei que iria fracassar…não. Não tinha ído mal assim.
Ela não quis comentar quem passou ou não no teste…mas que apenas 3 pessoas, de 24, acertaram 100% das questões. “Primeiro, levante-se por favor fulano de tal”. “Por favor, levante-se agora ciclano”. E…”levante-se o terceiro que acertou 100%, Cynthia Peck”.
Posso estar enchendo a bola para o assunto, mas você não deve imaginar a minha emoção e contentamento. Primeiro, porque não é nada fácil ser o patinho feio da classe. A que não é nativa, a que não fala e se comunica tão bem quanto os outros. Pode ser baixa estima de estrangeiro…ainda mais quando eles fazem questão de enfatizar como é difícil lidar com "aqueles indianos que trabalham no customer service em Mumbai e que não falam Inglês corretamente". Sabe como é...Agora penso que posso ser tão competente quanto eles. A cara de “awwww” será uma das maiores lembranças que terei. Isso porque foi um teste que todos os que falam pelos cotovelos nas aulas, que tem resposta pra tudo, que tem MBA e o caramba falharam…e eu não. E… estou feliz porque estou orgulhosa de mim mesma. E faz tempo que isso não acontece.
Aprendi que tenho que dar mais valor à mim mesma…acreditar na minha capacidade, mesmo que limitada em alguns sentidos. Até então, criar uma carreira num país que não é o meu, com uma lingua que não é a minha nativa, tem sido um desafio. Principalmente porque ultimamente tenho tentado trabalhar em empresas que não tenho conhecimento algum da área que eles atuam. E também não tenho um diploma geral como o de Business que, independente da área, tem sempre um pouco em comum com quase qualquer empresa. É por isso que acreditar em sí numa situação dessa é quase que dar uma colher de chá pro desapontamento. Continuo apreensiva, mas tenho aprendido que, mesmo que na marra, minha capacidade de aprendizado é ilimitada e que vale a pena tentar, e conseguir superar barreiras!
O mundo pode continuar estar desabando, e eu sei que as coisas ainda vão demorar um pouco pra se encaixar novamente…mas hoje eu estou feliz…bem feliz…MUITO FELIZ!